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sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

Natal e Ano-Novo na Encruzilhada: Solidariedade vs. Colonialismo nas Religiões de Matriz Africana

Natal e Ano-Novo na Encruzilhada: Solidariedade vs. Colonialismo nas Religiões de Matriz Africana


Das periferias e praias do Brasil, nos dias em que o capitalismo celebra seu ápice de consumo, ecoam respostas contraditórias. Enquanto o sistema impõe um calendário colonial, a reação dos terreiros e centros de religião de matriz africana não é uníssona. Diante da pressão, uma encruzilhada se abre: a da assimilação mercantil ou da insurgência cultural. Este artigo, a partir de uma perspectiva anarcocomunista, focaliza justamente os que escolhem o segundo caminho. Analisamos como, na prática concreta de parte desses espaços, o sagrado é ressignificado não para o lucro, mas para forjar trincheiras de cuidado comunitário e rebeldia anticolonial, em nítida oposição aos Charlatanismos que também proliferam.
Pessoa realizando oferenda para Iemanjá na praia ao pôr do sol, com barco de flores nas mãos, enquanto fogos de artifício iluminam os arranha-céus da cidade ao fundo. Representa a resistência cultural das religiões de matriz africana durante as festas de fim de ano.

Ópio do Povo ou Trincheira do Povo? A Contradição Anarcocomunista diante da Fé Perseguida


Partindo de uma perspectiva anarcocomunista, é preciso iniciar com uma contradição fundamental. Concordamos com a crítica marxista clássica de que, em sua função institucional e hierárquica, a religião frequentemente atua como "ópio do povo" – um mecanismo de alienação que pode adiar a libertação terrena, explorar financeiramente, incutir medos e criar limitações mentais que servem à manutenção da ordem vigente. No entanto, em um Estado que se diz laico mas é profundamente cristão-normativo, fazer essa crítica de maneira abstrata é inócuo e até perigoso. É necessário distinguir entre as religiões hegemônicas, que historicamente se aliaram ao poder, e as religiões perseguidas, que surgiram e sobreviveram como trincheiras de resistência cultural e comunitária. Nosso olhar, aqui, se volta justamente para estas últimas: as festas de fim de ano das religiões de matriz africana. Não como uma defesa dogmática da religião em si, mas como um reconhecimento de que, na prática concreta de terreiros e quilombos espirituais, a linha entre o sagrado e o comunitário muitas vezes se dissolve, gerando ações de apoio mútuo e preservação cultural que são, em si mesmas, atos de rebeldia anticapitalista e anticolonial.

Fazemos, portanto, uma defesa crítica e seletiva. Nossa solidariedade não é ingênua nem tribal. Está com a resistência cultural anticapitalista e o cuidado comunitário, e é por isso que devemos ser os primeiros a combater as deformações que surgem em seu seio. Nossa luta é contra a dominação em todas as frentes: o colonialismo de fora e o charlatanismo de dentro.

Isto significa rejeitar com igual veemência:

1. A exploração mercantil da fé, onde a espiritualidade é reduzida a negócio, centros operam como empresas e a promessa de salvação tem preço de tabela – a busca pelo "vil metal" que trai a comunidade.

2. A corrupção espiritual e o abuso de poder, onde figuras se utilizam do posto para explorar financeiramente, coagir, manipular ou abusar sexualmente de seus seguidores.

3. A degradação concreta do comum, como a perturbação do sossego, a ocupação de vias sem diálogo ou o abandono de resíduos em espaços públicos – atos que revelam desrespeito pela coletividade que dizem representar.

Esta crítica não visa uma tradição específica, mas todo e qualquer poder que oprima, seja ele religioso, estatal ou econômico. Defender a cultura popular é, necessariamente, declarar guerra às suas formas mercantilizadas e opressoras. A verdadeira revolução é intransigente: não pactua com o colonialismo nem com o capitalismo, mesmo quando ele veste roupas de axé.


Natal na Quebrada: Ajuda Mútua, Não Caridade Colonial


O Natal, festa alheia a seus fundamentos, é um espelho dessa encruzilhada. Enquanto uma vertente se rende ao espetáculo da caridade paliativa ou, pior, à busca do "vil metal", uma outra vertente, comunitária e consciente, ressignifica radicalmente a data. São estes terreiros, muitos nas periferias, que transformam a ocasião em um ato de solidariedade de classe. Sua ação é um gesto anarquista em essência: ajuda mútua direta, sem mediação do Estado ou das grandes ONGs.

É a comunidade organizada, através de suas próprias estruturas religiosas e sociais, cuidando dos seus. É um socorro que não vem de cima, com contrapartida de submissão ou conversão, mas do lado, do reconhecimento da necessidade coletiva.

Contudo, essa prática não está isenta da pressão colonial. Há uma expectativa social, uma coerção sutil, para que esses espaços religiosos "se integrem" ao calendário hegemônico, participando do ritual do consumo natalino. A verdadeira resistência está em fazer a caridade sem abandonar o axé. O presente material se torna uma extensão do cuidado espiritual que o terreiro já oferece. É uma forma de dizer: "Nós não celebramos este seu deus, mas respeitamos e cuidamos da vida que pulsa em nossa comunidade, em qualquer data."

Ano-Novo na Praia: Oferenda à Terra vs. Sorte no Mercado


No Ano-Novo, a resistência é ainda mais simbólica e ativa. Enquanto a cultura de massa propaga rituais individualistas de sorte – apropriando-se e esvaziando símbolos como o vestir de branco, uma cor que nos terreiros tem significado sagrado ligado a Oxalá –, as religiões de matriz africana realizam suas obrigações mais importantes à beira-mar. Ali, o branco não é moda, é fundamento. A celebração não é privada, mas pública e comunitária. O foco não é o desejo individual de sorte, mas a oferenda coletiva à natureza e aos orixás, inquices e voduns. É um ritual de restituição à Terra e de fortalecimento comunitário, em contraponto total ao consumismo e ao individualismo da virada cooptada pelo mercado.

A perseguição e a intolerância religiosa, no entanto, não tiram folga nas festas. As mesmas forças que criminalizam o funk e invadem terreiros o ano todo, frequentemente enxergam os rituais de Ano-Novo nas praias como "bagunça" ou "poluição", revelando, mais uma vez, o racismo religioso que vê as manifestações culturais e espirituais negras como uma perturbação à "ordem" branca e cristã.

Esta resistência não é de hoje. Ela é a continuação de uma luta pela existência que atravessa o oceano.

O Apagamento Transatlântico: Das Nações à Diáspora

Para entender a resistência atual, é vital confrontar um processo brutal de apagamento: o fato de que muitas das expressões religiosas praticadas hoje no Brasil como Candomblé, Umbanda, Xangô, Tambor de Mina, entre outras, são diásporas sobreviventes de tradições que foram sistematicamente destruídas em seu continente de origem. Não se trata de um desaparecimento "natural", mas de um genocídio cultural. Durante os séculos de colonização europeia na África, as potências coloniais (Portugal, França, Reino Unido, Bélgica) promoveram uma guerra aberta contra as religiões e culturas locais, consideradas "pagãs" e obstáculos à dominação e à evangelização.

Templos foram arrasados, sacerdotes e sacerdotisas assassinados ou escravizados, objetos sagrados saqueados ou destruídos, e a prática ritual foi criminalizada. Enquanto isso, no lado brasileiro do Atlântico, a mesma tradição era igualmente perseguida, mas encontrou nas senzalas, nos quilombos e na sincretização forçada com os santos católicos uma estratégia de sobrevivência clandestina. O resultado é o paradoxo histórico: cultos à orixás, inquices e voduns que hoje são vibrantes e fundamentais na identidade cultural brasileira, não existem mais em sua forma original em muitas regiões da África, onde foram suplantados pelo cristianismo e pelo islamismo coloniais.

Este apagamento duplo – no continente de origem e na tentativa de aniquilação na diáspora – torna cada terreiro em pé não apenas um centro espiritual, mas um arquivo vivo, um ato de insurreição da memória. Manter o axé aceso é manter viva uma história que o colonialismo quis apagar dos dois lados do oceano. É uma reexistência que desafia não apenas a intolerância religiosa do presente, mas também a violência histórica que tentou, sem sucesso, torná-la impossível.

Apoiar essa resistência exige ação concreta. É ir além da simpatia e: 1. Combater a intolerância religiosa sempre que surgir; 2. Apoiar economicamente os terreiros e iniciativas comunitárias (comprando de seus empreendimentos, doando para suas campanhas); 3. Respeitar os rituais e espaços sagrados, entendendo seu significado; e 4. Descolonizar o próprio olhar, reconhecendo nas práticas de matriz africana não folclore, mas filosofia, organização social e ciência ancestral em ato. Solidariedade, para um anarquista, é um verbo.

Conclusão da Seção: Axé é Cuidado Comunitário

Assim, a atuação verdadeiramente comunitária dos terreiros no fim do ano expõe o cerne de um projeto político. Ela demonstra que o axé, quando desviado da lógica do mercador e voltado para o povo, é a construção de poder popular a partir do cuidado. Eles não esperam pelo Estado-papai Noel; criam redes de apoio. Este é o antídoto contra o Charlatanismo: usar a estrutura comunitária não para explorar, mas para agir no mundo material.

O verdadeiro "espírito de Natal" que o capitalismo tenta vender é, na verdade, praticado o ano todo nos terreiros. E o verdadeiro "novo ciclo" não se compra com fogos de artifício, mas se constrói com oferendas de gratidão e luta. Enquanto o sistema promete presentes, a comunidade oferece presença. E é nessa presença coletiva, autônoma e insurgente que reside o verdadeiro poder revolucionário.
O axé, afinal, é mais que uma força: é um projeto de mundo.


E você, de que lado dessa virada vai estar? Vai repetir os rituais vazios do consumo, ou vai buscar apoiar e aprender com as comunidades que, há séculos, constroem presença onde o sistema só oferece presentes? A resistência também é um convite.

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