Exílio
Em janeiro de 1869, Netchaiev espalhou falsos rumores de sua prisão em São Petersburgo, então foi para Moscou antes de ir para o estrangeiro. Em Genebra, Suíça, ele fingiu ser um representante de um comitê revolucionário que tinha partido da Fortaleza Paulo e Pedro, e então ganhou a confiança do revolucionário em exílio Mikhail Bakunin e seu amigo colaborador Nikolai Ogarev. Ogarev, numa sugestão de Bakunin, dedicou um poema para Netchaiev:
O estudante (para meu jovem amigo Netchaiev)
Ele nasceu para um destino desgraçado
E lecionou numa escola difícil,
E sofreu tormentos intermináveis
Em anos de trabalho constantes.
Mas como os anos foram varridos
Seu amor pelas pessoas cresceu fortemente
E violenta sua sede pelo bem comum
A sede de melhorar o destino do homem.
Bakunin viu Netchaiev - a autêntica voz da juventude russa - na qual chamou de o “maior revolucionário do mundo”. Ele seguraria essa visão idealista após sua associação com Netchaiev virar perigosa para ele. Na primavera de 1869, Netchaiev escreveu o “Catecismo Revolucionário, um programa para a “cruel destruição” da sociedade e do estado. Às vezes é se falado que ele escreveu com Bakunin mas a verdade é que Bakunin denunciou o documento em 1870, escrevendo:
“Você desejava e ainda deseja fazer sua própria autocrueldade, seu próprio verdadeiro fanatismo extremista, na regra de uma vida comum....Renuncie seu sistema e você será um homem valioso; se, entretanto, você não deseja renunciar o sistema, você certamente se tornará um militante prejudicial, alto destrutivo, mas não para o estado, mas sim para a causa libertária...”
O Catecismo inclui a seguinte passagem:
“O Revolucionário é um homem predestinado. Ele não tem interesses pessoais, nem casos, sentimentos, afazeres, nem mesmo um nome próprio. Sua existência é somente por um propósito, um pensamento, uma paixão – a revolução. Coração e alma, não meramente pela palavra mas pela...””
O mais importante princípio do “Catecismo” – “o fim justifica os meios” – viraria o principal slogan de Netchaiev durante sua carreira revolucionária. Ele viu a imoralidade implacável na perseguição do controle total pela Igreja e o Estado, e acreditava que o esforço contra os dois deve ser feito por todos os meios necessários, sempre focando a destruições dos mesmos. A personalidade individual tem de ser abandonada pelo grande propósito num tipo de ascetismo espiritual na qual Netchaiev foi muito mais que um simples teórico, mas guiando princípios pelo qual ele viveu sua vida. Ele também formulou algumas táticas revolucionárias: A revolutionary "must infiltrate all social formations including the police. He must exploit rich and influential people, subordinating them to himself. He must aggravate the miseries of the common people, so as to exhaust their patience and incite them to rebel. And, finally, he must ally himself with the savage word of the violent criminal, the only true revolutionary in Russia".
O livro foi influência para as gerações futuras de grupos radicais, e foi republicado pelos Panteras Negras em 1969 – cem anos depois desde a publicação original. Também influenciou a formação dos militantes do grupo Red Brigades na Itália em 1969. Ogarev, Bakunin e Netchaiev organizaram a campanha de propaganda de material subversivo a ser mandado para a Rússia, financiado por Ogarev do então chamado “Fundo Bakhmetiev” (Bakhmetiev Fund), no qual tinha sido criado para subsidiar suas próprias atividades revolucionárias. Alexander Herzen não aprovou o fanatismo netchaievista e se opôs fortemente contra a campanha, acreditando que Netchaiev estava influenciando Bakunin em direção a uma retórica mais extrema. Contudo, Herzen emprestou muito dinheiro da organização para Netchaiev, no qual ele partiu para a Rússia para mobilizar o suporte para a revolução.
Retorno à Rússia
Tendo deixado a Rússia ilegalmente, Netchaiev teve que voltar para Moscou em 1869 com a ajuda dos contatos de Bakunin. Lá ele viveu uma vida severa, gastando dinheiro apenas nas atividades políticas. Ele fingiu ser um representante do departamento russo da “Rede de União Revolucionária” (na qual não existia) e criou uma afiliada da sociedade secreta chamada Narodnaya Rasprava (Народная расправа, "People's Reprisal" – Represália do Povo), na qual, ele dizia existir por bastante tempo em cada esquina da Rússia. Ele discursava apaixonadamente para estudantes sobre a necessidade de se organizar. Vera Zasulitch (escritora marxista) fala que quando ela encontrou Netchaiev pela primeira vez, ele imediatamente tentou recrutá-la:
"Netchaiev começou a me contar seus planos para organizar uma revolução na Rússia num futuro próximo. Eu me senti terrível: foi realmente doloroso para eu dizer ' Isso é pouco provável, Eu não sei sobre isso'. Eu podia ver que ele estava realmente sério, que isso era uma conversa séria sobre revolução. Ele podia e iria agir – ele não era o líder dos estudantes?... Eu não podia imaginar maior prazer do que servir a revolução. Eu tinha vivido somente para sonhar isso, e agora ele estava dizendo que ele queria me recrutar....E o que eu conhecia sobre 'o povo'? Eu conhecia somente as senzalas de Biakolovo e os membros do meu coletivo tecelão, enquanto ele era um trabalhador desde que nasceu."
Muito ficaram impressionados pelo jovem proletário e entraram para o grupo. Contudo, o fanatismo de Netchaiev parecia estar se tornando mais desconfiável para as pessoas a sua volta, até denunciando Bakunin como doutrinário, “falador com papéis e bocas”. O incidente no qual é retratado pelo escritor Dostoievski na novela política “Os Demônios” seria talvez um crime cometido por Netchaiev e seus camaradas na morte de I.I.Ivanov que teria discordado com Netchaiev sobre a distribuição da propaganda e por isso teriam o matado e escondido o corpo num lago.
O corpo teria sido achado e alguns dos revolucionários foram presos, mas Netchaiev escapou e foi para São Petersburgo em Novembro, onde ele tentou continuar suas atividades para criar uma sociedade clandestina. Em 15 de dezembro de 1869, ele deixou o país e voltou para Genebra.
Morte
Netchaiev foi aceito pelo Bakunin e Ogarev em seu retorno para a Suíça em Janeiro de 1870 – Bakunin escreveu “Eu pulei tanto de alegria que eu esmaguei o teto com a minha cabeça velha!” Logo após a reunião dos três, Herzen morreu, isso foi o que faltava para Netchaiev continuar suas atividades políticas. Netchaiev emitiu um número de proclamações mirando na diferente estrutura da população russa. Junto com Ogarev, ele publicou a Revista Kolokol (Abril – Maio, 1870, emitiu 1 até 6). Em seu artigo “Os fundamentos do Sistema Social Futuro” (Главные основы будущего общественного строя), publicado na Vontade do Povo (1870, número 2), Netchaiev partilhou sua visão de um sistema comunista na qual Karl Marx e Engels chamariam mais tarde de “comunismo de quartel”. Entretanto, a suspeita de Netchaiev em seus camaradas tinha crescido muito, e ele começou roubando cartas e papéis pessoais. Ele pediu ajuda para a filha de Herzen, Natalie. Quando Bakunin descobriu a duplicidade do comportamento de Netchaiev, começou a avisar seus amigos, mas sempre continuou defendendo o jovem. O Conselho Geral da liderança da organização de esquerda, a “Primeira Internacional”, oficialmente separou os dois (Netchaiev e Bakunin), alegando que ele tinha abusado do nome da organização. Depois de ler uma carta do editor para Bakunin, Netchaiev disse que mataria o editor se ele não fizesse o que Bakunin queria. Após isso, Netchaiev ficou ainda mais isolado de seus camaradas. German Lopatin, membro da Primeira Internacional, acusou Netchaiev de comportamento teórico sem escrúpulos e destrutivo, induzindo Ogarev e Bakunin a rachar suas relações com ele no verão de 1870 – embora Bakunin continuasse a escrever cartas apaixonadas para Netchaiev pedindo por reconciliação e avisando-o dos perigos que ele se encontrara com a lei, depois da morte de Ivanov. Em 1870, Netchaiev publicou uma edição da Revista Commune em Londres e depois, escondendo-se da polícia tzarista, foi para Paris e depois Zurique. Em agosto de 1872, Netchaiev foi preso em Zurique e entregue para a polícia russa. Ele foi preso em 1873 e sentenciado a 20 anos de trabalhos forçados por matar Ivanov. Netchaiev, enquanto preso na Fortaleza de Pedro e Paulo, conseguiu controlar os guardas com a força de suas convicções políticas e no final dos anos 1870, ele estava usando os guardas para passar correspondência com revolucionários do lado de fora. Em dezembro de 1880, ele estabeleceu contato com o Comitê Executivo do Narodnaya Volya e propôs um plano para sua fuga. Entretanto, ele abandonou o plano devido sua relutância para distrair os esforços dos membros do Narodnaya Volya de tentar assassinar Alexandre II. Netchaiev morreu em 1882 ainda em sua cela.
Referências
Payne, Pierre (1975). The Corrupt Society. New York: Praeger. p. 202. ISBN 0275510204
Bibliografia
Robynski. Nechaev And Bakunin: Left Libertarianism's Lavender Lineage. Northcote, Vic: Autonomous Tendency. 1994
Charley Shively, “Anarchism” in Encyclopedia of Homosexuality, ed. Wayne Dynes (New York: Garland, 1990), p. 51.
Andrew Hodges and David Hutter, With Downcast Gays, 1977.
Payne, Robert. The Fortress, New York, 1967
Pomper, Phillip. Bakunin, Nechaev and the "Catechism of a Revolutionary": the Case for Joint Authorship, Canadian Slavic Studies, Winter 1976, 534-51.
Bakunin rebukes Nechayev and his Chatechism for vanguardism
Avrich, Paul. "Bakunin and Nechaev", Freedom press ISBN 0-900384-09-3
Coetzee, J.M. The Master of Petersburg, Secker and Warburg. 1994
Movimento niilista russo
O fenômeno cultural russo conhecido como niilismo desenvolveu-se durante o reinado de Alexandre II (1881-1885), czar de carácter liberal e reformista. A década de 1860 é considerada a década do niilismo. A perda da Guerra da Crimeia (1854-1856), a abertura do regime ao exterior (abertura não só económica, mas também cultural e ideológica) e as relativas liberdades concedidas pelo czar - por exemplo, na imprensa - propiciaram um ambiente adequado para o desenvolvimento dessa nova subcultura. De carácter fundamentalmente intelectual, o niilismo representou uma reação contra as antigas concepções religiosas, metafísicas e idealistas. Neste sentido, os niilistas são considerados uma consequencia direta do ocidentalismo russo (sobre o tema ver também Nikolai Strakhov).[1] Os jovens, retratados como rudes e cínicos, combateram e ridicularizaram as ideias de seus pais. Sua sinceridade atacava a ofensa e o mau gosto, e parece que esta atitude foi o que mais definiu esse movimento. Essa atitude negativa e de desprezo ficou perfeitamente retratada no personagem Bazarov do romance "Pais e Filhos", de Turgueniev.
No extremo sentimentalismo de seus pais esses jovens só viam uma forma de hipocrisia. Observavam como seus românticos pais exploravam seus servos, maltratavam suas esposas e impunham uma disciplina estrita nos seus lares e, paradoxalmente, logo depois se dedicavam a fazer poemas e a exibir um comportamento ridículo, como ilustrou posteriormente o conhecido anarquista Piotr Kropotkin nas suas "Memórias de um revolucionário" (1899). Os niilistas rechaçavam e abandonavam em nome do progresso tudo o que não podia ser justificado cientificamente, como superstições, preconceitos e costumes. Criticavam as posições esteticistas na arte por se regozijarem com a beleza do abstracto e por carecer de uma utilidade social real. Adoptaram também uma postura ética Utilitarismo denominada "egoísmo racional", com base na qual buscaram redefinir as relações sociais em âmbitos como a amizade, o amor e o trabalho.
O niilismo foi um movimento cultural que influenciou a juventude aristocrática russa na segunda metade do século XIX. A maioria dos seus adeptos era a favor de reformas democráticas e da abolição da servidão na Rússia, razões pelas quais foram posteriormente perseguidos. Em suas Memórias de um Revolucionário,[2] Piotr Kropotkin o descreve:
Em primeiro lugar, o niilista declarou guerra contra o que ele descreveu como "as mentiras convencionais da humanidade civilizada." Sinceridade absoluta era a sua marca registada, e em nome dessa sinceridade ele renunciava, e pedia aos outros que também renunciassem, às superstições, preconceitos, hábitos e costumes que a sua razão não pudesse justificar. Ele recusava a dobrar-se à autoridade excepto à da razão, e na análise de cada instituição social ou hábito ele revoltava-se contra toda sorte de sofisma mais ou menos mascarado.
Essas pessoas não tinham nenhum ideal de reconstrução social em mente, nenhuma intenção revolucionária. Elas apenas queriam ensinar a massa de camponeses a ler, instruí-los, dar auxílio médico, e ajudá-los de qualquer forma a sair da escuridão e miséria, e aprender ao mesmo tempo quais eram os seus ideais populares de uma melhor vida social.
George Kennan, um americano que visitou a Rússia czarista, também se surpreendeu com a ideia, então prevalecente nos países ocidentais, de que os niilistas russos eram "arremessadores de bombas". Para ele, aqueles eram apenas cidadãos pacíficos, que sinceramente esperavam que o governo melhorasse a situação de seus súbditos.
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