Natal e Ano-Novo na Encruzilhada: Solidariedade vs. Colonialismo nas Religiões de Matriz Africana
Das periferias e praias do Brasil, nos dias em que o capitalismo celebra seu ápice de consumo, ecoam respostas contraditórias. Enquanto o sistema impõe um calendário colonial, a reação dos terreiros e centros de religião de matriz africana não é uníssona. Diante da pressão, uma encruzilhada se abre: a da assimilação mercantil ou da insurgência cultural. Este artigo, a partir de uma perspectiva anarcocomunista, focaliza justamente os que escolhem o segundo caminho. Analisamos como, na prática concreta de parte desses espaços, o sagrado é ressignificado não para o lucro, mas para forjar trincheiras de cuidado comunitário e rebeldia anticolonial, em nítida oposição aos Charlatanismos que também proliferam.
Ópio do Povo ou Trincheira do Povo? A Contradição Anarcocomunista diante da Fé Perseguida
Partindo de uma perspectiva anarcocomunista, é preciso iniciar com uma contradição fundamental. Concordamos com a crítica marxista clássica de que, em sua função institucional e hierárquica, a religião frequentemente atua como "ópio do povo" – um mecanismo de alienação que pode adiar a libertação terrena, explorar financeiramente, incutir medos e criar limitações mentais que servem à manutenção da ordem vigente. No entanto, em um Estado que se diz laico mas é profundamente cristão-normativo, fazer essa crítica de maneira abstrata é inócuo e até perigoso. É necessário distinguir entre as religiões hegemônicas, que historicamente se aliaram ao poder, e as religiões perseguidas, que surgiram e sobreviveram como trincheiras de resistência cultural e comunitária. Nosso olhar, aqui, se volta justamente para estas últimas: as festas de fim de ano das religiões de matriz africana. Não como uma defesa dogmática da religião em si, mas como um reconhecimento de que, na prática concreta de terreiros e quilombos espirituais, a linha entre o sagrado e o comunitário muitas vezes se dissolve, gerando ações de apoio mútuo e preservação cultural que são, em si mesmas, atos de rebeldia anticapitalista e anticolonial.

